Os ditadores só aparecem nos grafitti das ruas de Nicáragua |
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
Na Nicarágua o pessoal médico enfrenta heroicamente a pandemia, mas o sistema de saúde pública foi afundado pelo chavismo e num ambiente de terror trabalha para esmagar qualquer dissidência, descreveu reportagem de “La Nación” de Buenos Aires.
Os corredores dos hospitais estão empapelados com propaganda política, fotos de “heróis e mártires” sandinistas, do presidente Daniel Ortega e da vice-presidente Rosario Murillo, que parecem espionar como o Big Brother da conhecida novela “1984”.
Do lado de fora, nas delegacias e ministérios ondeja a bandeira vermelha e preta do partido governante.
“Lá dentro tudo é secreto”, disse a anestesista Maria Nela Escoto, despedida com mais uma dúzia de médicos especialistas por criticar o tratamento da pandemia por parte do governo.
Ortega alentou o povo a viver de forma “normal”. O governo só contabilizava 83 mortes e 2500 casos confirmados, quando o Observatorio Ciudadano, uma rede de médicos independentes, falava de 2087 decessos e pelo menos 7402 casos suspeitos.
A polícia faz “enterros expressos” pelas noites em cemitérios vigiados.
Durante quase três meses o pessoal sanitário ficou proibido de usar o material especifico contra a epidemia “para não alarmar'' os pacientes.
A Dra. Escoto foi expulsa do hospital Lenin Fonseca porque assinou junto com quase 600 médicos, uma carta pública pedindo equipamentos de proteção para os trabalhadores da saúde em hospitais públicos.
As expulsões foram ordenadas pelo Dr. Gustavo Porras, líder sindicalista que é deputado e presidente sandinista do Parlamento de Nicarágua.
O oncologista pediátrico Gustavo Méndez ficou atendendo em sua casa após ser expulso do Hospital de Niños porque defendeu uma quarentena que o governo bolivariano não gostava |
Nem os jornalistas podem ingressar nos centros de saúde e se tentam se aproximar com câmaras são detidos pela Polícia ou ativistas do governo.
“Os trabalhadores da saúde estão desanimados e têm medo. Temem se contagiar e perder o emprego”, disse o médico Fernando Rojas, anestesista também demitido do hospital Bertha Calderón.
Rojas foi admoestado várias vezes por pedir máscaras e luvas para os funcionários.
“A subdiretora do hospital, Ana Lídia Ortiz, vigia pessoalmente os médicos e os fotografa nos corredores. Faz trabalho de espião”, garante o médico.
A principal oncologista, Indiana Talavera, foi removida há três meses por solicitar máscaras. “Isso fez desabar o serviço de oncologia”, lamentou.
As autoridades de saúde recusaram atender a manifestantes oposicionistas feridos pela Polícia, registrou a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) que contabilizo 328 mortos e mais de 2.000 feridos nos protestos.
No hospital infantil Vélez Páiz um vigia “tirou a máscara da cara de um médico”', contou Rojas.
Dos 800 empregados do hospital Bertha Calderón, 250 foram enviados “em repouso” a suas casas, com sintomas de coronavírus.
Até 1º de julho morreram por coronavírus pelo menos 38 médicos, 22 enfermeiros e 11 funcionários administrativos.
Para reduzir as cifras oficiais do Covid-19, o governo ordena registrar os decessos como pneumonia atípica, infarto ou simplesmente paro respiratório.
Hospitais lotados, médicos punidos, doentes desaparecido, ninguém acredita nos números do governo bolivariano |
O ministério de Saúde deixou de publicar seus relatórios epidemiológicos semanais e o governo não atende à imprensa.
Até simpatizantes de Ortega foram demitidos por manifestarem solidariedade com seus colegas banidos, como foi o caso da ginecologista Maria Isabel Selva.
“Atingimos níveis de repressão e vingança até contra o pensamento”, escreveu o pediatra oncologista Fulgêncio Báez, que apoiou os sandinistas nos anos 80.
O Dr. Adán Alonso atendia voluntariamente aos pacientes de Covid-19 recusados nos hospitais de León e Chinandega. Pelo seu sacrifício altruísta era chamado de “o doutor do povo”.
Ele morreu de coronavírus e a polícia bloqueou seus funerais com tropa anti-distúrbios, perseguiu os carros que participaram da procissão fúnebre e confiscou as bandeiras nacionais que as filhas do médico morto levavam em sinal de protesto.
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